terça-feira, 23 de outubro de 2007

AS TAXAS

Há cerca de 25 anos tive um problema auditivo, extremamente desagradável diga-se, que me tirou muitas noites de sono, talvez porque eu não gostasse e ainda não gosto de ir aos hospitais. Só em último recurso é que vou ao hospital, eu sei que deveria ir mais vezes, uma consultazinha de vez em quando, umas análises anuais, uns tratamentos, mas quando dou conta de que as esperas são intermináveis, de que os clientes são quase sempre os mesmos, de que os horários só se cumprem para sair... acho sempre que o melhor é não ir para lá.
Nesse tempo disseram-me para ir ao Santa Maria, que lá era melhor, que se não fosse lá, só num especialista... e eu fui a Lisboa. Urgências com ele, que era a melhor maneira de ser atendido, porque isso de consulta só lá para o 32 de Trezembro. Umas horas de espera, um médico muito simpático que afirmou peremptório que a operação era inevitável, mas... “entretanto tome estes comprimidos, pode ser que.... E volte cá para o mês que vem!”
Segunda consulta, com outro e... o mesmo! Até que à 12ª consulta, não sei porquê, eu falei um pouco mais alto ao médico e... operação marcada! Operação realizada e com os agradecimentos ao Dr. Mário Andreia, aqui estou 25 anos depois com outras mazelas, mas bom dos ouvidos. E quanto paguei? Nada, claro! Então um trabalhador, com os impostos em dia, os descontos para assistência na doença feitos mensalmente, teria de pagar um serviço para o qual sempre descontou?
Entretanto os tempos mudaram...
Caramba, tenho aqui uma borbulha que tem aumentado de tamanho, será que... é melhor ir a um especialista, tenho ouvido dizer que nos hospitais é uma chatice para ter uma consulta e um consultório particular é na hora, embora se pague um pouco mais... mas só um pouco mais vim a saber.
Consulta feita e...
- Olhe, o melhor é ir ter comigo ao Hospital, eu estou lá de serviço e tratamos disso num instante...
- E como faço, Sr. Dr?
- Chega lá ao guichet, inscreve-se, paga a taxa, diz que tem consulta marcada, que entretanto eu marco lá no hospital e espera que eu o chame.
- Então muito bom dia, Sr. Dr.
E tudo correu bem, cheguei no dia marcado, paguei a taxa moderadora, porque não sou velho, nem criança, nem bombeiro voluntário, nem dador de sangue, nem desempregado, nem...
O Sr. Dr. ainda me disse para lá voltar afim de verificar se estava tudo bem, mas já sabem como é, olhei no espelho, “humm acho que está tudo bem”, além disso perder tempo, andar mais umas dezenas de quilómetros de automóvel, encontrar uma multidão de utentes na fila, pagar outra taxa para ouvir dizer que está tudo bem, que não devo apanhar sol...
Hoje recebi um ofício. Em vez de me agradecerem o facto de não os ter chateado mais vez nenhuma e desejarem que tudo me corra pelo melhor e com muita saúde, o Hospital notifica-me (qual informar, qual carapuça, notificar é que é bom, põe logo estes caloteiros em respeito), notifica-me, dizia eu, para pagar mais 23,50€ (vinte e três euros e cinquenta cêntimos) de taxas moderadoras em dívida, relativas a histologias, electrocirurgia e excisão de lesão benigna. Mas não se assustem que estes tratamentos demoraram 20 minutinhos, o penso caiu logo à saída do hospital e eu depois tratei de tudo sozinho.Ora toma, que é para aprenderes! Tendencialmente gratuito, não é? Vinhas ao hospital e só pagavas a taxa moderadora no guichet?
Entretanto lembrei-me que o ano passado o governo aumentou o meu desconto para a ADSE, em 0,5% fixando os descontos em 1,5%. E mesmo assim não chega? Ainda preciso de pagar mais estas taxas todas, só porque não sou velho, nem criança, nem bombeiro voluntário, nem dador de sangue, nem...
Fui verificar a folha dos descontos e lá estava... 38,82€, o que multiplicado por 14 significa uma contribuição de 543,48€ anuais...
Para concluir, o ofício do hospital ainda é do tempo da “pedra lascada”, porque não dá ao cidadão a possibilidade de pagamento por multibanco, o que me obriga a gastar mais uns trocos num cheque ou vale de correio, quando poderia fazer o pagamento aqui no meu computador, sem qualquer encargo e imediatamente.
E anda o governo com tantas ganas informáticas a promover o serviço “perdi a carteira”, quando o contribuinte só encontra o “perdi a paciência”.

segunda-feira, 15 de outubro de 2007

"TEORIA DA CONCEPÇÃO DO MECANISMO"



O Nobel da Economia, de 2007, foi entregue a 3 economistas americanos, os quais desenvolveram a “teoria da concepção do mecanismo”, uma teoria que bem no fundo nos induz a uma prática alto lá com o charuto! Não sei se já repararam nesta referência da teoria da concepção… pois é, sem uma boa prática não há teoria que conceba. Podem existir uns créditos em conta própria ou uns débitos, de preferência, em conta alheia, mas sem movimento, sem prática, não se vai lá, muito embora estes americanos provavelmente ainda não saibam que o maior banco privado português (?) anda a perdoar calotes aos amigos e filhos dos administradores, segundo se conta, que eu não confirmo nem desminto, ou seja, aí eu não mexo uma palha nem para conceber a teoria.
Segundo ouvi, a “teoria da concepção do mecanismo” é a mais segura para saber quando uma organização está bem ou mal no aspecto económico, preconiza formulas e regras que nunca falham, desde que o pai-administrador não perdoe os calotes que o filho faz ao banco, acho eu… mas estão a dizer-me que há uma rubrica de incobráveis, já orçamentada nos bancos para solucionar estes problemas. E qual é o problema? pergunto eu, não sei… então nunca ouviram dizer que um pai deve sempre perdoar a um filho? Onde estão os valores humanos dessa cambada que grita contra esta golpada, sabendo que gostavam de ter um pai assim?
- Pai! Pai! Oh pai!!!
- Vai chamar pai ao Jardim!
Quando eu era jovem, o Robin dos Bosques era o meu ídolo, sacava aos ricos para dar aos pobres. Ora, se leio nos jornais que o Jardim-filho foi perdoado porque não tinha como pagar, deduzo que o rapaz é pobre. Se o banco era do pai, que é rico, temos aqui uma história cheia de moral e o meu Robin dos Bosques, já deixou a floresta de Londres e passeia-se por Lisboa…
- Pai! Pai! Oh Pai!!!
- Vai chamar pai ao Jardim!
Entretanto para que se entenda esta “teoria da concepção do mecanismo” direi que eu, professor, conseguiria os 12 milhões em 500 anos de vida com 2.000 euros mensais, que infelizmente ainda não ganho. Aqui vem mesmo a propósito dos 500 anos, aquela frase muito usada nos tempos que correm “não tenho vida para isso”, mas na verdade trocaria esse monte de notas por meio milénio de vida saudável…
Talvez a “teoria da concepção do mecanismo”… é que nesta área da concepção eu já me movimento com um certo à vontade.

quinta-feira, 11 de outubro de 2007

O GERÚNDIO




Nos tempos que vão correndo, em pleno século XXI, cada vez mais as novas tecnologias vão ocupando o lugar de destaque que, em muitos sectores da sociedade vai fazendo por merecer, conquistando jovens e menos jovens para novas formas de comunicação e dinâmicas empresariais.
Estou reparando que num único parágrafo já lá vão quatro gerúndios, o que não sendo tão importante como isso, e retirando alguns abusos abrasileirados, funcionando como bengala de quem vai tendo alguma vontade de escrever, cronicando, está servindo às mil maravilhas, especialmente nesta crónica. E já vão, para não escrever indo, mais seis gerúndios…
Tudo isto a propósito do governador do Paraná, um estado do Brasil, que não foi de modas e decretou, com chancela e tudo, o funeral do gerúndio, aquele tempo verbal que representa tão bem ou melhor a idiossincracia do que é ser brasileiro.
Este governador é um cromo, digo eu, ou melhor, está sendo um cromo, daqueles que vão entrando diariamente no guiness da parvoíce. Então não é que o homem está querendo acabar com o gerúndio para aumentar a produtividade dos funcionários públicos brasileiros? Afinal há sempre alguém que nos vai deixando com vontade de dar umas boas gargalhadas e só não estou entendendo como é que as televisões portuguesas ainda não estão entrevistando o governador do Paraná. Elas pelam-se por uma reportagem, e melhor ainda se a repórter escolher um enquadramento diferente de uma porta de tribunal. E já lá vão mais seis gerúndios…
Diz ele, possivelmente com alguma razão, que quando o contribuinte se desloca a uma repartição para saber o estado em que se encontra o seu processo, os funcionários respondem “está indo, estamos tratando, estamos resolvendo…” o que naturalmente leva a que nada se resolva.
O governador está convencido que sem gerúndio vai funcionar melhor? Então venha a Portugal, que aqui está tudo no pretérito perfeito… quer ver?
- Bom dia!
- …
- A menina pode informar-me se já deram resposta ao requerimento que entreguei aqui há seis meses?
- Seis meses? O sr. Director ainda não deliberou. Volte cá para o mês que vem!

...............
- Bom dia!
- ...
- Era sobre o requerimento...
- Trouxe os documentos?
- Era só...
- Sem documentos não posso fazer nada.
- Mas...
- O sr. Director saiu, não pode atender.
- Quando acha que...
- Traga o recibo que lhe passei para comprovar a entrega dos documentos e volte para a semana!
- Bom dia e obrigado.
- ...
E isto tudo sem gerúndio…
A propósito, achei por bem colocar nesta crónica uma foto sugestiva, em que as maçãs com gerúndio vão caindo, ao lado de cidadãos e instituições que por cá vão indo…